quarta-feira, 20 de março de 2013

Partido aos pequenitos


Antes de tudo, quanto aos golpes de estado, declaro apoiante com condição, quando esses se destinarem ao derrube de regimes ditatoriais; e repudiante com convicção, quando esses se destinarem ao derrube de regimes democráticos.
Conheci, através de um documento elaborado e publicado para a posteridade, a posição agora oficializada, do PRS, quanto a esse momento de grande escalada, no agravamento dos nossos famosos problemas sociopolíticos, com mais essas previsíveis consequências do último golpe, e ainda em curso. E nesse oportuno documento de fórum partidário, também se quis traficar óbvias concepções políticas, para segundo uma certa intelligentsia, melhor solucionarmos esses mesmos problemas, com argumentos na necessidade largamente solidária, de incluir todos os imagináveis interessados, e mais os que para tal se voluntariarem.

Tanto desejáramos dignas mudanças nas orientações políticas da nossa sociedade, de tanto que os outrora combatentes pela libertação nacional, com comportamentos humilhantes, entenderam cobrar-nos, os onze anos de vários sacrifícios, que sempre passaram nas nossas matas, que logo no surgimento da primeira possibilidade, para escolha dos nossos governantes, com a implementação de um regime democrático e multipartidário, embriagados numa compreensível euforia, constituímos uma maioria, para livrarmos dos incómodos opressores. Mas tão difícil que era a congénita ambição, de celebrarmos a nossa nacionalidade, saboreando em cada momento, uma verdadeira liberdade, de nada adiantou. Porque o resultado das primeiras eleições, ditas livres e democráticas, inequivocamente expresso nas urnas, não teve consideração soberana, para o mal do nosso, pelo menos, sossego na pobreza, conforme o despoletar da estúpida guerra civil, com elevados prejuízos materiais, e perdas gratuítas de vidas humanas, acabou por evidenciar.

Numa das seguintes eleições gerais, movidos pela situação de desespero, que entretanto, se aprofundou ainda mais, com as consequências da referida guerra, levou-nos a preferir, num mero exercício de absoluta negação, da autoridade dos desgastados libertadores, o manhoso populismo do então destemido candidato presidencial, Kumba Yalá, e com ele, colocamos no centro do poder político, um partido, uma vez legalizado perante os ditames na conjuntura, tal como muitos dos seus mais conhecidos elementos, sem linha de orientação ideológica consistente; tal como muitos dos seus mais conhecidos elementos, sem projecto político definido nos prazos; e tal como muitos dos seus elementos, sem noção de planeamento duma governação sustentável. Um partido, uma vez legalizado perante os ditames na conjuntura, que para a maioria dos seus fervorosos militantes, vai servindo como meio apropriado, para um fácil acesso, à despudorada delapidação dos bens públicos.

Isso mesmo! Caso contrário, não estaria a defender um hipotético enquadramento legal, para consolidação do golpe em curso, que segue violando os mais básicos princípios democráticos, com a criação de um instrumento político qualquer, dotado de poderes semelhantes, mas por conveniência, superiores aos da Assembleia Nacional Popular, que deverá incluir interesses tão difusos, numa clara preocupação de agradar lobos e raposas, para que nenhum desses imprevisíveis quadrúpedes, famintos, venham a reclamar direito próprio ao quinhão, e pôr em causa o infame conforto, que a necrofilia vai proporcionando.

Questionar a pluralidade da Assembleia Nacional Popular na actual conjuntura, ou noutra conjuntura por constatar, é brincar aos pequeninos. Porque num regime democrático, como apesar de todos os pesares, ainda é, no nosso caso, pluralidade sustenta a livre existência, de diferentes formações políticas, com diversas ideologias de orientação política, que nas ocasiões da preparação dos escrutínios, através dos seus programas governativos, apresentam-se em igualdade de circunstâncias, ao eleitorado, para este, no momento exacto das votações, opte para um dos programas, em defesa dos seus interesses, ele, o eleitorado, e nunca, na defesa dos interesses das formações políticas.

E com os resultados saídos das urnas, os mais votados ocupam em proporcionalidade, os respectivos lugares, na Assembleia Nacional Popular. Portanto, sabendo que, para que uma determinada formação política, tenha direito a um lugar na Assembleia Nacional Popular, deva merecer esse lugar, com um determinado e número significativo de votos, mesmo assim, levantar questões de pluralidade, quando se julga não estar representada num hemiciclo, os interesses de todas as formações políticas, e mais outros interesses, que nem sequer enfrentaram, ou enfrentando, não conseguiram superar o exame democrático, com esse propósito, é um feito de rara generosidade, mas não deixa de ser um comportamento irresponsável, em toda largura do termo.

Podem continuar nessa degradante cegueira política, de excluir a verdade das urnas, de todas as vossas estratégias, para uma vegetativa permanência no poder, enquanto no silêncio imposto, o povo vai entranhando as sevícias duma miséria revoltante. Cedo ou tarde, a rigorosa justiça da culpabilidade inerente, acabará por vos castigar, como agora está a castigar, cada um a sua maneira, e sem piedades, muitos dos prepotentes doutras épocas.

Espero, e desejo que no lugar dessa vossa constante apologia do caótico, ganhem devida maturidade, e comecem a preocupar com a sobrevivência política, depois da completa e inglória saída dos palcos eleitoralistas, do fundador desse partido, que não deixa de contar com enormes potencialidades, para os futuros desafios democráticos.
Compatriotas, e ilustres dirigentes do PRS, o que nós, os eleitores guineenses, e o povo em geral, tínhamos almejado, num passado recente, naquele contexto específico, com a vossa eleição, representando uma maioria de vontades, que só com uma assertiva reestruturação, de toda a vossa formação política, tanto nos aspectos ideológicos, como nos modus operandi, voltará a acontecer, era uma regeneração, cada vez mais adequada, das nossas instituições, com a promoção de cidadãos qualificados, nas diferentes áreas profissionais, virados para a modernidade dos dias, e munidos de ideais progressistas.
 
Ser, Conhecer, Compreender e Partilhar.
 
Flaviano Mindela dos Santos